domingo, 12 de outubro de 2008

Apenas uma metáfora


Sim, foi exatamente assim: atrasado eu e ela estávamos quando entramos na sala de aula. E o professor, logo aquele que diziam ser o mais chato com relação a atrasos e "conversinhas".
No tempo anterior, estávamos sentados no fundo da sala, já que, quando chegamos, a turma estava cheia. Esse é um ponto relevante. Ao sentarmos, já preocupados com as anotações que dançavam no quadro, agitávamos na tentativa de pegar folha e lápis para registrarmos as palavras. Neste mesmo instante, vir-me-ei a ela para perguntar algo que se encontrava escrito. Coitada. Foi isso, foi real e exatamente isso que me levou a refletir. Enquanto ela respondia e eu questionava - vale ressaltar que tudo isso numa fração de segundo- começou ele. Reclamava e nos pedia que conversasse fora da sala de aula. Confusos nós ficamos, já que à mesma proporção que nós não entendíamos nada, ele aumentava o tom e o grau de nervosismo.
Deve-se, portanto, lembrar que nós estávamos isolados no final da turma, uma vez que nosso material lá estava devido à última aula. No entanto, aquele professor de início de período, que não nos conhecia, deve ter pensado: devem ser uns "fanfarrões". Ou seja, para ele, nós devíamos ser aqueles alunos típicos do fundo da sala, aqueles que mal ligavam para o professor e para a matéria. Assim que percebemos que a reclamação havia parado a aula e concentrado toda atenção sobre nós, desculpamo-nos e mantivemo-nos, como mudos, naquele recinto.
Pensei, então... E como deve ser a sensação dos que sofrem grandes injustiças? De que valeria nós nos desculparmos pelo atraso, que fora ocasionado por motivos que não estavam sob nosso controle? De que valeria um inocente protestar e lutar pelos seus direitos dentro de um país onde o Congresso é tão corrupto quanto à polícia, que deveria nos proteger? De que nos valeria justificar a "breve conversa", devido ao fato de eu não ter entendido a letra do mestre no quadro? De que valeria uma criança, um adolescente, um desempregado, um favelado, um morador de rua gritar, espernear, se suas palavras correm um imenso risco de jamais serem escutadas? De que valeria nós falarmos que não somos os "fanfarrões" que parecíamos ser em nossa primeira aula?
O que fazer? Refletir apenas a respeito dessa realidade e continuar calado frente à situação? Ou tentar, de fato, argumentar e questionar? No primeiro momento, responderia que de nada. Mas, refletindo bem, nenhum esforço é em vão. Ainda mais, quando tal esforço emerge de uma injustiça, seja algo mais leve como o ocorrido conosco, ou algo mais pesado e sujo como ocorre diariamente no nosso Brasil.
Nossa sorte, no entanto, foi que criamos uma imagem ruim em nossa primeira aula, o que poderia ser revertido depois, facilmente. Pouca ou nenhuma sorte, porém, é daqueles que, entre outros terríveis exemplos, pegam anos infindos de cadeia por um crime não cometido. Daqueles que não têm voz. Daqueles que, ao passar na rua, a maioria de nós prefere ignorar. Ou, ainda, daqueles totalmente abandonados pelo sistema e pela família. Assim é o nosso país e, certamente, muitos outros por aí. Uma pequena injustiça, quando nós temos outras coisas com que nos preocuparmos, por mais que doa, passa. Porém, para aqueles que convivem com essa peça inerente ao nosso sistema, o dia-a-dia é muito mais complicado, e o esquecer, improvável. Que as palavras sejam medidas, que as situações sejam, de fato, analisadas. Que menos gente adoeça devido à injustiça. Que nós passemos a enxergar. Que eles sobrevivam.


IThauan dos SantosI

8 comentários:

Anônimo disse...

Que realmente todos tenham direitos tanto de questionar quanto de justificar,tanto de ouvir quanto o de falar.
Teu texto me fez refletir muito.Sério mesmo.
Parabéns pelo blog! :D

Ps: Eu estou lhe dando um selo.

Unknown disse...

adoooro!
um pequeno fato gera uma mega reflexão...
infelizmente também sou assim. Conclusão: Vivo pensando olhando pro nada o tempo todo! rs
Vocês escrevem muito bem lindinhos. bjão!

Mariana disse...

porra, sensacional!

saudades dos dois!
beijobeijo

Anônimo disse...

Adorei o texto! olha eu aqui :3. muitas saudades.

-Millo.O- disse...

Muito bom seu texto ... liberdade acima de tudo!!
ta muito maneiro seu blog!!
se der passa no meu
www.michelkyo.blogspot.com
vlws flws

Flávio Souza disse...

Eu não ligo a mínima para atrasos na minha sala de aula! Só não gosto mesmo é de gente entrando e saindo toda hora...

Me importo é com a atenção e o real comprometimento dos alunos! Aí sim! Me preocupo - e muito!

O resto é frescura de professor rabujento!

Roberta disse...

Por não passar mais tanto tempo com você, tinha esquecido que além de você ser uma pessoa incrivelmente boa e iluminada, escreve lindamente!!!
O blog está lindo!!!!
Bjinhossss

Anônimo disse...

esse texto consegue refletir toltalmente a realidade do nosso dia-a-dia . PERFEITO > ! (: